Conteúdo

Entenda o Direito Econômico do atleta e empréstimo entre times

O mercado futebolístico abrange uma série de questões e direitos dos jogadores,  que atraem os olhares de investidores do mundo todo. 

As relações entre jogadores e os times que estão vinculados ficam estabelecidas por meio de contrato de trabalho, a partir da publicação da Lei Pelé (9.615/98)

Antes da promulgação da referida norma, o passe ou Direito Econômico dos jogadores era livre, sendo que os mesmos ficavam vinculados às agremiações infinitamente, mesmo que transferidos para outras entidades desportivas no decorrer do tempo.

Com o passar dos anos, o incentivo ao esporte profissional  sofreu grande expansão, motivando diversos investidores a adentrarem neste mercado, cujo interesse maior é no aproveitamento de vantagens financeiras tanto ao clube quanto ao investidor, além de auxiliar na função social do esporte na vida dos jogadores, como forma de educação e melhoria de vida. 

Diante da necessidade de regulamentação do “mercado” desportivo de acordo com o avanço da profissão na sociedade, sobreveio a Lei Pelé, onde novas regras sobre a contratação de jogadores passaram a valer.

As negociações relativas ao jogador também são vistas como fundo de investimentos. Ou seja, um possível investidor tem interesse no direito econômico proveniente do desempenho de determinado jogador aplicando certo valor em dinheiro, propiciando vantagens para o clube vinculado. 

Porém, existem restrições e cuidados que devem ser levados em consideração para investimentos no âmbito desportivo. Considerando a relevância destes negócios, elaboramos um conteúdo completo para você conferir a  seguir.

O que é o passe ou Direito Econômico do atleta

O passe ou Direito Econômico do atleta é denominado como o vínculo entre o atleta e a entidade desportiva que está vinculado. 

O Decreto Lei n° 53.820/1964 instituiu o termo “passe”, que nada mais era do que o vínculo desportivo do atleta com a agremiação.

Assim, o atleta vinculava-se a um time por meio da compra em dinheiro do passe e, para ser transferido a outra entidade desportiva, deveria ser realizado pagamento pela parte interessada. Caso não houvesse a compra do passe, o atleta ficava vinculado à agremiação de origem eternamente.

Ocorreu que diversos questionamentos passaram a ser feitos, pois o jogador era tratado como mera mercadoria. 

Isso porque o atleta era de certa forma vendido entre times, na medida em que havia negociação do passe, cujo fim era a obtenção de vantagens econômicas oriundas do desempenho do jogador.

O atleta deveria consentir com a negociação, porém tinha o direito a tão somente 15% do valor negociado. 

Em 1967, sobreveio a Deliberação n° 9, do Conselho Nacional do Desporto – CND, dispondo que o jogador poderia desvincular-se do clube detentor do passe ou Direito Econômico do atleta tão somente se o clube interessado efetivasse a compra, em valor especificado pelo detentor. 

Certamente, muitas vezes o valor era desproporcional e considerado abusivo, o que dificultava a conclusão do trâmite para transferência do jogador. 

Com a Lei Pelé, as coisas mudaram. 

Mudanças no Direito Econômico do atleta com a Lei Pelé

Conforme dissemos no início, a Lei Pelé trouxe significativas mudanças nas relações de trabalho dos jogadores. 

A principal alteração diz respeito à extinção do passe do atleta e necessidade do vínculo entre o atleta e o clube ser estabelecido formalmente por contrato de trabalho, nos termos regidos pela CLT.

O termo “passe” foi substituído por “vínculo federativo”, elemento acessório do contrato de trabalho.

Significa que, com a rescisão do contrato de trabalho, o vínculo federativo se extingue automaticamente. 

Nada obstante, importante ressaltar que o vínculo federativo é negociável, pois trata-se de uma forma de investimento atrativo no mercado desportivo. 

Não somente ao investidor, mas ao jogador e ao clube vinculado, há diversos benefícios econômicos que, inclusive, auxiliam clubes a crescer.

Quando entrou em vigor 

A lei entrou em vigor em 24 de março de 1998, porém sofreu diversas alterações até o presente ano.

O que está previsto

A Lei Pelé dispõe sobre normas gerais relacionadas ao desporto.

Principalmente, baseou-se nos princípios fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988. 

O art. 2, da Lei Pelé, dispõe que o desporto, como direito individual, tem como base os princípios:

I – da soberania, caracterizado pela supremacia nacional na organização da prática desportiva;

II – da autonomia, definido pela faculdade e liberdade de pessoas físicas e jurídicas organizarem-se para a prática desportiva;

III – da democratização, garantido em condições de acesso às atividades desportivas sem quaisquer distinções ou formas de discriminação;

IV – da liberdade, expresso pela livre prática do desporto, de acordo com a capacidade e interesse de cada um, associando-se ou não a entidade do setor;

V – do direito social, caracterizado pelo dever do Estado em fomentar as práticas desportivas formais e não-formais;

VI – da diferenciação, consubstanciado no tratamento específico dado ao desporto profissional e não-profissional;

VII – da identidade nacional, refletido na proteção e incentivo às manifestações desportivas de criação nacional;

VIII – da educação, voltado para o desenvolvimento integral do homem como ser autônomo e participante, e fomentado por meio da prioridade dos recursos públicos ao desporto educacional;

IX – da qualidade, assegurado pela valorização dos resultados desportivos, educativos e dos relacionados à cidadania e ao desenvolvimento físico e moral;

X – da descentralização, consubstanciado na organização e funcionamento harmônicos de sistemas desportivos diferenciados e autônomos para os níveis federal, estadual, distrital e municipal;

XI – da segurança, propiciado ao praticante de qualquer modalidade desportiva, quanto a sua integridade física, mental ou sensorial;

XII – da eficiência, obtido por meio do estímulo à competência desportiva e administrativa.

A lei dispõe sobre órgãos e suas funcionalidades relativas ao desporto, a fim de gerar segurança jurídica nas relações. 

Porém, é relevante mencionar que a principal mudança da Lei Pelé foi o “passe livre” do atleta. O que significa?

Com a necessidade de regularizar o contrato de trabalho entre o jogador e o clube, fica assegurado ao atleta que, a o fim do prazo acordado, está livre para se vincular a qualquer outra entidade desportiva.

Ou seja, não existe a necessidade de ser comprado o passe para desvincular-se ao clube originário. Trouxe liberdade ao atleta, portanto.

Direitos federativos do atleta

Os direitos federativos correspondem ao direito de um clube registrar o atleta na Federação (CBF) como vinculado a ele. 

Há liberdade de inclusão de cláusulas nos referidos contratos de trabalho, que correspondem expressamente ou não aos direitos federativos do atleta.

Percebe-se que os direitos federativos são integralmente do clube que o registra, após formalização do contrato de trabalho. Por tal razão, não podem ser parcialmente cedidos. 

Quais são os direitos federativos

Podem ser considerados como todos os direitos do atleta federado, vinculado a um clube, conforme as condições no contrato de trabalho devidamente registrado

.

Pois bem. Ao ser formalizada a relação de trabalho entre o jogador e o clube, este detém os direitos federativos do atleta até o término do prazo de vigência contratual, nos termos das cláusulas expressas.

Direitos econômicos do atleta

Por sua vez, os direitos econômicos não se confundem com os direitos federativos. 

A primeira diferença se dá pela possibilidade de ser cedido parcialmente o direito econômico. 

É, inclusive, uma forma de investimento do próprio clube, que negocia a cessão onerosa de um percentual relativo à negociação de parte dos direitos federativos, auferindo vantagens financeiras para si e para o atleta.

Os direitos econômicos correspondem à receita relativa à transferência do atleta, temporária ou definitiva.

Dessa maneira, é comum que os direitos federativos do atleta estejam divididos em percentuais entre o empresário (investidor) e o clube, por exemplo.

Empréstimo entre times

A negociação dos direitos econômicos decorrentes do empréstimo do atleta entre times se dá pelo clube, detentor dos direitos federativos, com terceiros.

Significa que o clube é exclusivamente responsável pelas negociações dos direitos econômicos de empréstimo ou transferência entre times, não sendo possível a interferência de terceiros na celebração de contratos. 

Com base nisso, a FIFA dispôs no art. 18 bis do Regulamento de Transferências, acerca da impossibilidade de terceiros investidores interferirem nas transferências a respeito dos valores ou o momento. Destacarmos o dispositivo normativo:

Nenhum clube poderá firmar contratos com qualquer outra parte contratante ou qualquer terceira parte para fins de adquirir a capacidade de influência na relação de emprego e nas transferências, e ainda em questões relacionadas a sua independência, suas políticas ou performance de seus times”.

Dessa maneira, o investidor pode adquirir os direitos econômicos relativos ao desempenho do jogador (direitos federativos), mas todas as questões relacionadas à negociação são de responsabilidade e competência do clube. 

Contrato

Quando se fala em contrato de trabalho do clube com o jogador, o instrumento não pode perdurar menos do que 90 dias e mais do que 5 anos.

Por outro lado, contratos entre os entes federativos e terceiros para transferências ou empréstimos também merecem atenção.

Não é incomum que investidores realizem seus aportes financeiros para obtenção parcial dos direitos federativos de atletas de diferentes agremiações,  por meio de cessão, conforme dissemos ao longo deste post.

Os contratos têm especial relevância nesse ponto, a fim de manter a competitividade segura entre os clubes, haja vista que em uma competição dois atletas de diferentes times podem competir.

Assim, é importante que o contrato esteja esmiuçado para evitar dores de cabeça, considerando o limite do investidor no vínculo do atleta com o clube original.

Por exemplo, algo comum de aparecer nos termos pactuados diz respeito à possibilidade do investidor vetar a escalação de um atleta quando em uma competição possuir dois atletas de diferentes times.

Pode ocorrer, também, de existir disposição contratual permitindo que o investidor rescinda o contrato de trabalho entre o atleta e o clube vinculado, indicando o novo clube que o mesmo será transferido, se houver poderes expressos para isso.

Tais questões são relevantes, pois, com base no entendimento da jurisprudência nacional e internacional no ramo desportivo, tais disposições contratuais podem ser invalidadas com base na impossibilidade de haver interferência de terceiros no vínculo contratual do atleta. 

Por isso, é preciso ter cautela na descrição das cláusulas a respeito dos poderes de investidores e do vínculo do atleta com a entidade desportiva que se encontra vinculado. 

Recomendamos, por tais razões, que um advogado desportivo acompanhe esta etapa de elaboração e revisão de contratos, a fim de resguardar os direitos do atleta, do clube e do investidor.

Valores

Como funciona a precificação das transferências e empréstimos entre times?

O valor da negociação é relativo, a depender de cada jogador e clube, bem como de outros fatores como se a transferência é para time nacional ou do exterior.

Isso porque os acordos de transferências de jogadores para o exterior têm sido facilitados, o que traz maiores vantagens para a progressão de carreira. 

Por isso, é importante o conhecimento das normas brasileiras e internacionais, a fim de evitar a invalidação de contratos.

Além dos valores do contrato em si, existem as taxas destinadas à CBF para registro dos respectivos contratos de transferência, empréstimos e etc. 

Porém, durante a pandemia, a cobranças das referidas taxas foram isentas pela CBF, trazendo uma economia significativa aos clubes.

Quando pode emprestar

Um atleta poderá ser emprestado apenas após atuação em 6 partidas pelo menos no clube que está vinculado. 

Entende-se por atuação quando o jogador entre em campo ou quando receber cartão amarelo no banco de reservas.

Caso não tenha o mínimo de partidas, o atleta não pode ser emprestado para outro time da mesma divisão.

Direitos do atleta

Os jogadores vinculados a um clube têm direitos e deveres relacionados ao vínculo de trabalho formalizado por contrato. 

Citamos alguns a seguir.

1 – Direito ao recebimento do salário

O atleta tem direito de receber o salário em dia e, ainda, pode rescindir o contrato após três meses de atraso. 

2 – Direito de imagem

Os atletas, além dos salários, têm direito ao recebimento de verba de direito de imagem,

É uma verba de natureza indenizatória e, portanto, não integra o salário para fins de cálculo de verbas trabalhistas.

3- Aviso prévio em cláusulas compensatória desportiva

O contrato de trabalho com o clube deve prever o prazo de vigência, que deverá ser respeitado. 

Porém, caso o clube opte por rescindir antecipadamente, o atleta tem direito a uma verba denominada “aviso prévio”, de natureza indenizatória, que deve ser paga no valor mínimo equivalente aos salários mensais que teria direito até o fim do contrato, com limitação de até 400 vezes o valor do salário mensal. 

4- Direito de arena

Para a transmissão dos jogos na televisão, o clube recebe uma verba da emissora. 

O direito de arena é uma verba destinada ao jogador que corresponde à parte da cota paga pela emissora. 

Este direito vale para os atletas que atuam em campo, bem como àqueles que ficaram no banco de reservas.

É como se fosse o direito de imagem do atleta por ser divulgado em televisão durante o jogo.

Deveres do atleta

Assim como os direitos devem ser resguardados, os atletas devem cumprir com suas obrigações previstas em contrato, como:

  1. Cumprir os compromissos que lhe forem atribuídos, especialmente os jogos, campeonatos e treinamentos;
  2. Ser honesto e fiel com o time que está vinculado, assim como aquele que for realizado o contrato de empréstimo temporário;
  3. Manter a forma física;
  4. Respeitar os diretores, superiores do clube;
  5. Dentre outros.

Rescisão de contrato do atleta

O contrato de trabalho do atleta deve perdurar no mínimo 90 (noventa) dias e no máximo 5 (cinco) anos. 

Porém, é possível que ocorram situações de rescisão antecipada. Confira as consequências abaixo.

  1. Por parte do clube
    1. Quando pode rescindir

O clube pode rescindir o contrato por mera vontade, sem justificativa, porém, deverá pagar o aviso prévio ao atleta, conforme mencionamos anteriormente.

  1. Multa

A multa pela rescisão antecipada por parte do clube é equivalente aos salários mensais que o jogador teria direito até o prazo final do contrato, limitado a 400 vezes do salário mensal.

  1. Por parte do atleta
    1. Quando pode rescindir

O atleta poderá rescindir o contrato quando houver atraso no pagamento de três salários consecutivos. O pedido tem respaldo no art. 479, da CLT, como justo motivo para a rescisão, fazendo jus a todas as verbas trabalhistas decorrentes da relação empregatícia.

Caso opte por rescindir o contrato para vincular-se a outro clube, por exemplo, após um empréstimo ou por transferência, o jogador e o clube novo respondem solidariamente pelo pagamento de indenização prevista em cláusula compensatória por quebra de contrato.

Considerando as peculiaridades que envolvem os contratos de trabalho de atletas, recomenda-se que você esteja amparado por um profissional especialista no ramo.

Tem dúvidas sobre o assunto? Deixe seu comentário, será um prazer lhe orientar.

Compartilhe em